Faz pelo menos 15 anos que as empresas brasileiras começaram a contratar contadores de histórias. "Acredito que elas tenham sentido necessidade de uma ferramenta poderosa de comunicação, liderança e transformação pessoal", explica Ilan Brennam, escritor e educador no mundo corporativo. A real novidade é o boom do storytelling, ou seja, o grande número de empresas que estão passando a contar histórias. A explicação é simples: embora os efeitos persuasivos das histórias fossem especulados há algum tempo, a psicologia conseguiu, nas últimas décadas, comprovar que as histórias influenciam fortemente nossas atitudes, temores, desejos e valores. Os psicólogos afirmam que ingressar em mundos fictícios altera radicalmente a maneira como uma informação é processada. Quanto mais envolvidas em uma história, mais suscetíveis as pessoas ficam a ser modificadas por elas.
Em outras palavras, histórias baixam nossa guarda intelectual (erguida quando lemos argumentos factuais que nos deixam críticos e céticos) e deslocam-nos para um plano emocional, no qual as defesas se enfraquecem. É tudo o que as empresas precisam em um mundo com competição demais e atenção de menos. Annette Simmmons, autora de The Story Factor, resume o motivo da emergência desta indústria: diante da sobrecarga de informação à qual estão submetidas hoje, as pessoas querem poder confiar nos dados que recebem, e isso é mais fácil de entender com uma história, em que cabe ao ouvinte decidir se vai acreditar no que é dito. Isso porque as pessoas valorizam mais as conclusões quando chegam por conta própria.
O uso número 1 do storytelling. Paul Smith, autor de Lead with a Story, adianta que o storytelling é atributo fundamental para a liderança, argumentando que seu valor como ferramenta é muito maior do que se acredita. Seja no discurso do CEO com a diretoria, seja em uma conversa de corredor do estagiário com o chefe, a diferença está na narração de histórias. Um relato cativante e líderes com capacidade de articulá-lo são fundamentais em cada etapa de gestão empresarial. As boas histórias - aquelas que conseguem criar uma conexão emocional com a audiência. Assim, permitem abordar os grandes desafios de liderança pois: (1) inspiram e mobilizam uma organização no sentido da meta acordada, (2) estabelecem metas e uma visão do futuro, (3) estimulam a inovação e criatividade, (4) ensinam lições importantes e (5) mostram como os problemas podem ser solucionados.
Pequeno guia para o narrador. Em seu livro, Paul Smith oferece aos executivos sete recomendações para uma história eficientemente persuasiva: 1. Começar com um contexto. 2. Usar metáforas e analogias. Bem escolhidas, elas podem tornar a história mais impactante. 3. Emocionar. As pessoas tomam decisões baseadas majoritariamente em emoções. Então elas racionalizam até sentirem que finalmente agiram de maneira lógica. 4. Manter as histórias específicas e concretas, assim serão mais atraentes e memoráveis. Os protagonistas devem ser de carne e osso, com problemas reais, deste modo a audiência se identificará com eles e validará o resto. 5. Incluir uma surpresa. Esse recurso faz com que o público preste atenção e se lembre melhor da história. 6. Empregar um estilo narrativo apropriado e ser conciso, indo direto ao ponto. 7. Ir além do contar uma história à audiência para criar uma cena da qual esta possa participar.
O maior especialista em storytelling, Robert McKee, explica como empresas de todos os tipos podem melhorar o modo de comunicar com funcionários, clientes e investidores por meio do storytelling.
"Eu conduzi treinamento para várias apresentações de IPOs (oferta pública de ações). Funciona assim: os investidores se sentam em uma sala e entra um gestor depois do outro, pondo suas cartas na mesa; essa pessoa sabe imediatamente se foi bem ou não porque o cheque vem praticamente na hora. Muitos executivos responsáveis por IPOs se deram conta de que seus PowerPoints não motivavam os investidores a preencher cheques. Então comecei a treiná-los para, como os mesmo dados das apresentações, contar histórias de sua empresa batalhadora, como começou e como superou problemas, até a conclusão de que agora ela está pronta a abrir o capital e conquistar o mundo. De repente, os cheques voltaram a ser preenchidos. Os executivos perceberam que jogar informações em cima das pessoas as paralisam, daí a mudança."
História com propósito. As pessoas querem as "histórias com propósito". No caso, propósito é fazer com que ajam e a forma de contar as histórias as convence a agir. Não tem a ver com final feliz ou triste, mas com um final ativo ou passivo na vida real, que leve as pessoas a desejar agir em ver de ficar esperando instruções. Essa motivação é resposta emocional à história. Converter informações em histórias é o que funciona porque motiva as pessoas a agir. Além disso, informações são questionadas, mas histórias não. As informações servem simplemente para dar credibilidade à história. Uma história com propósito não é uma história preparada, uma parábola, como a piada contada para quebrar o gelo no início de uma apresentação ou reunião. Posso até mostrar que isso é útil, mas não a ensino. A técnica que me dedico a ensinar é: pegar a realidade imediata e, de maneira improvisada, transformá-la em história viva, bem na frente das pessoas, em menos de cinco minutos.
Oral ou escrito. Histórias corporativas são, em sua maior parte, narrativas orais. Mas elas funcionam com a mesma eficácia quando escritas. A mesma fórmula essencial funciona em qualquer mídia. É só uma questão de escolha do meio. Sabe porque a fórmula nunca muda? Porque a vida nunca muda. Histórias são metáforas da vida.
Humor ou não. As histórias não tem, obrigatoriamente, de fazer a plateia rir. O humor não é obrigatório. O que é realmente essencial é que as pessoas se envolvam emocionalmente - de modo positivo ou negativo, que as leve para frente e para trás. Para que isso aconteça, elas têm de entender três coisas: (1) o personagem protagonista, (2) os valores que estão em jogo e (3) as forças e os antagonistas que impedem o protagonista de conseguir o que quer.
Emoção sempre. O maior erro que os narradores corporativos tentem a cometer é que eles se concentram em rechear a história de idéias, achando que só cumprirão sua obrigação se transmitirem todas as informações da lista. Uma história assim não é contada com emoção. As pessoas ouvem um monte de informações e idéias, as não sentem nada, e o mais grave é que isso não as motiva a agir.
O narrador. Todas as pessoas são, em alguma medida, contadoras de histórias natas - ou foram, até que isso lhe foi arrancado. Toda criança conta e adora histórias. As histórias se encaixam perfeitamente na mente humana; a narrativa é a forma como a mente interpreta a realidade. Pense em como uma pessoa se relembra seu passado: é como uma série de estatísticas? Não, ela volta, pega os fatos principais, elimina tudo o que é banal e concentra esses eventos em uma história, a que chama de memória. A mente faz isso naturalmente. Se consegue se lembrar, você consegue contar uma história porque sua mente contou a história para você.
Como você imaginar o futuro? Também com uma história. Todo ser humano é capaz de pensar: "Se eu fizer isso, vou arrumar encrenca, mas se eu fizer aquilo, tudo bem". Todo mundo é capaz de pensar no formato história. Então isso é natural. Na escola arrancaram isso você, querendo que você execute tarefas e memorize dados. Treinam o aluno a pensar e a se expressar retoricamente com argumentos indutivos e dedutivos. Eu sugeriria a quem não se sente um contador de história nato que se lembre de quando era criança. Você conta história para si mesmo todos os dias, seja pensando no passado, seja pensando no futuro. Se deixaram esse contador de histórias ir embora, você pode trazê-lo de volta.
Falar em público. Contar histórias passa também por falar em público, o que as pessoas contumam fazer apoiadas em uma apresentação em PowerPoint, que as conduz passo a passo. Então o problema pode ser outro: não é que você não sabe contar história, e sim você não consegue improvisar. Para ser um storyteller, realmente é preciso ser capaz de improvisar. Isso exige coragem, mas sobretudo, prática.
Falar em público é um exercício como outro qualquer - nadar, correr, jogar tênis. Você tem de aprender a improvisar de pé. A melhor maneira de começar, entre as que conheço, é ter uma pequeno público caseiro, como a esposa ou um grande amigo. Você ensaia e pratica diante dele. Atore que interpretam Shakespeare não entram no palco na noite de estréia e saem falando, sabia? Eles ensaiam por 12 semanas. E têm Shakespeare ao lado deles, enquanto você não tem.
A prova de fogo são as crianças e jovens. Se conseguiu atrair atenção da esposa ou do amigo, talvez seja porque eles querem lhe agradar, mas se atrair a atenção dos seus filhos, ai já existe algum avanço. Se captar a atenção de uma criança de 6 anos, então pode comemorar para valer! Ela tem a amplitude de atenção de um mosquito. Sente-a ao seu lado e diga: "Vou te contar uma históra". Se essa criança ficar um pouco sentada, parabéns!
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