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Quais são suas reais motivações?

Quando Nietzsche chorou, Irvin D. Yalom, 1995, Editora Ediouro, pag 150
 
Reassumindo o controle, Breuer reverteu à autoridade médica:

- Entendo seu dilema precisamente, professor Nietzsche, mas ouça-me até o fim. Descobrirá que podem existir meios de sofrer menos enquanto continua a conduzir suas investigações filosóficas. Por favor, deixa-me apresentar meu plano de tratamento. (...) Proponho que seja admitido na Clínica Lauzon de Viena para um mês de observação e tratamento.

(...) - Doutor Breuer, sou grato por seus esforços em meu favor e já tirei proveito desta consulta: as informações que me forneceu sobre enxaqueca são preciosas para mim. Mas não é recomendável para mim internar-me em uma clínica. (...) Seu argumento precede, contudo é-me totalmente impossível aceitar sua recomendação. Minha objeção ao seu plano e tratamento tem raízes nos níveis mais profundos e fundamentais. Além disso, existe um obstáculo mundando mais importante: o dinheiro! Neste momento, é impossível.

(...) - A família de minha esposa, os Altmanns, dotaram a Lauzon de dois leitos gratuitos que posso usar ao meu critério. Assim, a clinica não cobraria nenhuma taxa nem eu, honorários por meus serviços. Saio mais rico de cada uma de nossas discussões! Portanto, nenhum problema! Está tudo acertado! Notificarei a clínica Lauzon. Que tal o senhor se internar ainda hoje?

(...) - Devoto minha vida às suas prescrições. Mas o senhor não leu o suficiete. Há anos, solitário, tenho realizado tal dissecação psicológica: tenho sido o objeto de meu próprio estudo. Mas não estou disposto a ser sua cobaia! O senhor estaria disposto a ser a cobaio de outro? Permita-lhe que lhe formule uma pergunta direta, doutor Breuer: qual é a sua motivação neste projeto de tratamento?

- O senhor recorre a mim em busca de ajuda. Eu a ofereço. Sou um médico. É a minha atividade.

- Simplista demais. Ambos sabemos que a motivação humana é bem mais complexa e, ao mesmo tempo, mais primitiva. Repito a pergunta: qual é sua motivação?

- É uma questão simples, professor Niezsche. A pessoa pratica sua profissão: um costureiro costura, um cozinheiro cozinha e um clínico clinica. Ganha-se a vida, pratica-se sua profissão e minha profissão é servir, aliviar a dor.

- Essas não são respostas satisfatórias às minhas perguntas, doutor Breuer. Quando o senhor diz que um clínico clinica, um cozinheiro cozinha ou que a pessoa pratica sua profissão, isso não é motivação: isso é interesse.. O senhor omitiu de sua resposta a consciência, a escolha e o auto-interesse. Prefiro quando diz que se ganha a vida; isso ao mesmo, pode ser entendido. Luta-se por forrar o estômago de comida. Mas o senhor não está cobrando dinheiro de mim.

- Poderia lhe formular a mesma pergunta, professor Nietzsche. O senhor diz que nada aufere de seu trabalho. Para que, então, filosofa?

- Ah! Existe uma importante distância entre nós. Eu não alego que filosofo para si, enquanto o senhor continua fingindo que sua motivação é servir-me, aliviar minha dor. Tais alegações nada têm a ver com a motivação humana. Elas fazem parte da mentalidade de escravo astutamente engedrada pela propaganda sacerdotal. Disseque suas motivações mais profundamente! Achará que jamais alguém fez algo totalmente para os outros. Todas as ações são autodirigidas, todo serviço é auto-serviço, todo amor é amor-próprio. -- As palavras de Nietzsche assomaram mais rapidamente, e ele prosseguiu célere -- Parece, surpreso com esse comentário? Talvez esteja pensando nequeles que ama. Cave mais profundamente e descobrirá que NÃO ama a eles: ama isso sim as sensações agradáveis que tal amor produz em vocë! AMA O DESEJO, NÃO O DESEJADO. Assim, permita que pergunte de novo por que deseja servir-me? Novamente, perguntou-lhe, doutor Breuer -- aqui a voz de Nietzche se tornou severa --: quais são suas motivações? (...)

Breuer lutou para responder. Quais seriam? Ficou pasmado com a resistência de sua mente à pergunta de Nietzsche.

(1) Seu desejo de ajudar Nietzsche, quando começara? Em Veneza, é claro, enfeitiçado pela beleza de Lou Salomé. Assumir o tratamento do professor Nietzsche proporcionaria não apenas um vínculo permanente com ela, mas uma oportunidade de se elevar perante os olhos dela.

(2) Que mais? (...) Sabia que estava intrigado pelo desafio intelectual à sua frente. (...) Nenhum outro médico em Viena teria aceito tal paciente.

(3) Depois, havia Freud. Tendo proposto Nietzsche a Freud como um caso didático, faria papel de bobo se o professor recusasse sua ajuda.

(4) Ou estaria querendo estar próximo dos grandes? (...) Nietzsche representava o futuro da filosofia alemã: aqueles livros de Nietzche tinham um quê de genialidade.

NENHUMA dessas motivações, sabia Breuer, tinha alguma relação com o homem Nietzsche, a pessoa de carne e osso diante dele. Assim, tinha que se manter em silêncio sobre seu contato com Lou Salomé, seu júbilo em avançar onde outros médicos tinham medo de trilhar, sua ânsia pelo toque de grandeza -- Breuer ressentidademen reconheceu -- as desagradáveis teorias de Nietzsche sobre motivação tivessem mérito!.

 

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