De pai para filho |
Aventuras de Tibicuera, Erico Veríssimo, 1937, Editora Globo, 2a edição, 2003, pag. 43
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Passaram se muitas e muitas luas. Meu filho cresceu ao meu lado. Era um rapagão desempenado, da minha altura. Tão parecido comigo, que muitas vezes outros guerreiros da tribo não sabiam distinguir o filho do pai. E como o rapaz se chamasse também Tibicuera, a confusão ficava maior ainda.
Eu amava meu filho. Meu filho me amava. Ensinei-lhe a arte da vida e a arte da guerra. Contei-lhe os meus segredos. Ele aprendeu a nadar; a caçar; a fazer pinturas bonitas no corpo; a curar feridas produzidas por flechas envenenadas; a ser mais ágil que a onça, masi flexível que a cobra, mais impetuoso que o tapir.
Às vezes passávamos ambos horas e horas um ao lado do outro, conversando. Eu não me esquecia das palavras do pajé, que me dissera que o pai pode continuar no filho, o filho no neto, e assim por diante, de sorte que o tempo e a morte praticamente deixam de existir.
(...)
Meu filho foi pai de um filho, que recebeu também o nome de Tibicuera e cresceu na taba à nossa sombra. Passei a amar meu neto como amava meu filho. Era uma cadeia de afeição, de compreensão, de camaradagem. Contei a meu filho o que o pajé me disse aquela noite em sua oca a respeito do tempo, da morte e da eterna mocidade.
E o resultado disso é estar eu hoje aqui, depois de mais de quatrocentos anos, sem saber se duratne todos esses quatro séculos eu fui apenas UMA PESSOA ou uma séria de pessoas do mesmo sangue, com o mesmo espírito. |
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